A sociedade das bexigas (Contém Ironia)


        Uma sociedade formada de semelhantes bexigas criaria as filosofias mais idealísticas a respeito do "estado de ausência de sofrimento". Como qualquer extensão em direção ao prazer ou motivada pelo prazer poderia ser sentida somente como dolorosa, a bexiga desenvolveria um medo à excitação agradável (angústia de prazer) e criaria teorias sobre a "maldade", a "propensão para o pecado" e a "ação destrutiva" do prazer. Em suma, seria um asceta do século vinte. Conseqüentemente, teria medo de qualquer idéia de possibilidade da tão ardentemente desejada relaxação; e então odiaria semelhante idéia e finalmente perseguiria e mataria qualquer um que falasse a respeito. Juntar-se-ia a outros seres igualmente constituídos, peculiarmente rígidos, e traçariam rígidas normas de vida. Essas normas teriam a função única de garantir a menor produção possível de energia interior, i.e., de garantir a tranqüilidade, a resignação, e a continuidade das reações habituais. Faria quaisquer tentativas inadequadas para dominar os excedentes de energia interior que não pudessem ser utilizados através do prazer natural ou do movimento. Por exemplo, criaria insensatas ações sádicas ou cerimônias de natureza essencialmente automática e de pequena finalidade (comportamento religioso compulsivo).      As metas realistas se desenvolvem por si mesmas e, portanto, obrigam ao movimento e ao desassossego aqueles que se movem em direção a elas.
        A bexiga poderia ser sacudida por convulsões que emergiriam subitamente, por meio das quais se descarregaria a energia represada. Por exemplo, poderia ter acessos histéricos ou epiléticos. Poderia, por outro lado, tornar-se completamente rígida e desolada, como ocorre na esquizofrenia catatônica. Em qualquer hipótese, a bexiga seria sempre atormentada pela angústia. Tudo o mais decorre inevitavelmente dessa angústia, por exemplo o misticismo religioso, a crença em um führer ou o martírio sem significação.
        Como na natureza tudo se move, se modifica, se desenvolve, se expande e se contrai, a bexiga encouraçada teria uma atitude estranha e hostil em relação à natureza. Imaginar-se-ia como "algo muito especial", pertencente a uma raça superior pelo simples fato de usar colarinho duro ou uniforme. Representaria essa "cultura" ou essa "raça" que é incompatível com a natureza, e a natureza seria considerada como "vil", "demoníaca", "impulsiva", "descontrolada" e "ignóbil".

       

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